A obsessão por brincar e colecionar bonecas reborn na vida adulta é um problema?
A prática de atividades lúdicas e outras atividades podem ser benéficas à saúde.

Nas últimas semanas, os bonecos reborn – réplicas de bebês feitos à mão para se assemelharem a crianças reais, com seus detalhes hiper-realistas – têm alcançado destaque midiático e nas redes sociais.
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A arte reborn, que existe há décadas, ganhou destaque recentemente devido à popularização de conteúdos produzidos por influenciadoras com suas coleções de bonecas reborn. O tema também tem causado disputas judiciais, projetos de lei no Congresso e alertas sobre a proibição de uso de direitos de mães com filhos pequenos.
O debate central em torno da controvérsia dos bebês reborn é a suposta tensão entre o saudável, o ato de brincar e possuir bebês reborn como um hobby, como acontece na maioria das colecionadoras, e um possível impacto na saúde mental.
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A psicóloga clínica Larissa Fonseca ressalta que atividades lúdicas, como brincar com bonecas, estimulam regiões do cérebro ligadas à criatividade, ao relaxamento e ao prazer. “A vida adulta pode ter momentos de brincadeira, contanto que não se torne uma evasão da realidade”, declara a CNN. Assim, brincar e colecionar bonecas reborn não é, por si só, um problema.
Ademais, para a psicóloga Fabiana Guntovitch, brincar e colecionar bonecas, incluindo os bebês reborn, pode ser uma atividade terapêutica, contanto que realizada de forma consciente e intencional, em conjunto com o tratamento psicoterapêutico.
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“Pode ser terapêutico no sentido de representar uma oportunidade de elaboração de dores e questões internas dessa pessoa, que está utilizando um símbolo para se relacionar não com a boneca, mas consigo mesma”, afirma Guntovitch.
A psicanalista relata um caso: uma mulher com Alzheimer que emprega uma boneca bebê realista como forma de relaxamento. “Dentro do Alzheimer, ela revive a época em que os filhos eram bebês. E ter uma boneca reborn a acalma. Isso é extremamente terapêutico para ajudar essa senhora que está em uma realidade interior.”
Contudo, Guntovitch ressalta que artigos, brinquedos e outras atividades de lazer e hobbies não substituem a psicoterapia.
Adicionalmente, a psicóloga Larissa Fonseca complementa que os bebês reborn podem atuar como um “objeto transicional” em processos de luto ou no enfrentamento da depressão. “O cuidado com o boneco, em certas situações depressivas, pode incentivar a retomada de uma rotina ou do afeto em si, do cuidar, do carinho e do amor”, explica. Contudo, ela reforça: “É imprescindível que seja algo transitório e até acompanhado por um profissional”.
Qual é o motivo pelo qual as bonecas reborn geraram tanta controvérsia?
Se adultos brincarem ou colecionarem bonecas, e, em alguns casos, até terapêutico, então, por que o universo reborn tem gerado tanta polêmica? Para Guntovitch, a sociedade não aprecia o ato de brincar na vida adulta, especialmente quando isso é voltado para o feminino.
A prática de homens jogarem videogame é frequentemente vista como normal. No entanto, existe uma resistência quando se trata do feminino. Afirma que brincar na vida adulta é saudável e terapêutico, como colorir, desenhar, montar quebra-cabeças, jogar videogame e, inclusive, brincar com bonecas.
Ademais, a especialista considera que pode haver uma questão relacionada aos papéis de gênero estabelecidos socialmente. “O espaço destinado à mulher na sociedade é o de servir ao outro. Assim, quando dedica seu tempo a algo que não é para ela mesma – como brincar de boneca –, a mulher causa estranhamento”, declara.
A mulher não possui esse espaço social. Acredita-se que as 24 horas dela devam ser dedicadas a servir à família, ao trabalho, aos filhos, aos vizinhos, aos pais e aos outros.
É, por isso, inclusive, que é difícil ver homens brincando com bebê reborns, apesar de também existirem alguns colecionadores – como é o caso do padre Fábio de Melo. “Um menino brincar de boneco não é aceito nem na infância, quem dirá na vida adulta”, observa Guntovitch. “Estamos falando de estereótipos e de machismo estrutural.”
A brincadeira e a coleta de bonecas reborn podem ser um problema?
Para avaliar se existe algum comprometimento da saúde mental ao brincar ou colecionar bonecas reborn, é necessário compreender, primeiramente, se há prejuízos na rotina do adulto.
“Qualquer diagnóstico que observamos a partir do comprometimento da rotina da pessoa: ela está deixando de trabalhar? Ela está vivendo em função daquele objeto? Ela está sofrendo excessivamente com esse sintoma? Qual é o comprometimento na vida dela?”, explica Fonseca.
Para determinar se se trata de um transtorno mental ou de uma questão entre fantasia e realidade, é necessário observar se há isolamento, se existe sofrimento intenso sem objeto, se há prejuízo nas relações sociais, familiares e profissionais, e se o uso do objeto se restringe ao preenchimento emocional.
Guntovitch acrescenta, ainda, que é importante analisar todo o contexto e a dinâmica que a mulher possui com o bebê reborn. “Uma coisa é a pessoa levar o bebê aos lugares que frequenta porque as pessoas possuem curiosidade e querem conhecê-lo. Outra coisa é levá-lo aos compromissos porque, supostamente, ele não pode ficar sozinho”.
É necessário analisar a subjetividade do próprio ato, o porquê e como a pessoa está vivendo o hobby e os significados que ele lhe proporciona. Esses fatores vão indicar se a pessoa está bem ou não, afirma.
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Fonte: CNN Brasil