A política de austeridade da Petrobras deve priorizar a distribuição de dividendos
O cenário internacional complexo não pode servir de razão para reduções destinadas unicamente a projetos estratégicos e aos funcionários da empresa.

A Petrobras obteve lucro líquido de 35,2 bilhões de reais no primeiro trimestre de 2025, um resultado 48,6% superior ao do 1T24. Esse desempenho positivo reverte o prejuízo de 17 bilhões de reais apurado no trimestre anterior e representa 95,9% do lucro líquido acumulado em 2024 (36,6 bilhões de reais).
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Contudo, em reação ao cenário internacional de queda do Brent, a empresa anunciou um período de “restrições” e “redução de despesas” em projetos novos e em andamento, mas que não devem impactar os compromissos de alta distribuição de dividendos aos seus stakeholders – União e acionistas privados, nacionais e estrangeiros.
O lucro se originou, sob a ótica operacional, da manutenção da capacidade produtiva de petróleo e gás da empresa, de seu melhor desempenho comercial no mercado interno, impulsionado pelo crescimento no volume de vendas (2,9%) e nos preços médios dos derivados (6,2%), e, por fim, em sua dimensão financeira, da redução das despesas operacionais (-57,8%), decorrentes das variações cambiais e monetárias líquidas (18,3 bilhões de reais no primeiro trimestre, em comparação com -27,4 bilhões de reais no trimestre anterior) e de receitas não recorrentes de aproximadamente 2,6 bilhões de reais, provenientes de pagamentos contingentes dos blocos Sépia e Atapu e do campo Bauna.
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No primeiro trimestre do ano, a empresa já acumulou ganhos equivalentes aos previstos para todo o ano de 2024, demonstrando sua capacidade de geração de valor em um cenário de incertezas. O principal desafio estratégico da Petrobras reside na distribuição equitativa desse valor entre os diversos grupos de interesse – Estado, investidores privados e a sociedade em geral. A mudança de uma trajetória de grandes dividendos e a consequente redução dos investimentos devem ser o compromisso da maior empresa brasileira.
Entre o primeiro trimestre de 2018 e o primeiro trimestre de 2025, a Petrobras tornou-se uma máquina de distribuição de dividendos, com a estatal pagando R$ 498,7 bilhões, que superou seu valor de mercado atual de R$ 430,2 bilhões e representou 88,1% de todo o lucro acumulado nesse período (R$ 565,8 bilhões). Durante o mesmo período, os investimentos foram de R$ 403,5 bilhões, correspondendo a apenas 71,3% do lucro registrado e uma redução de 19,0% em relação aos dividendos pagos.
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Esses aspectos evidenciam que o público-alvo da empresa permanece sendo os acionistas e seus interesses de curto prazo, e que sua política de investimentos no período mais recente foi direcionada unicamente para a manutenção de sua linha de produção, principalmente durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).
Entre 2018 e 2022, a companhia se caracterizou pela redução sistemática dos investimentos e pelo pagamento de megadividendos. A partir de 2023, observou-se uma recuperação do volume de investimentos e uma redução no patamar de distribuição de dividendos, que permanecem altos em relação aos níveis históricos da companhia.
Durante o governo Bolsonaro, os lucros foram expressivos, alcançando um montante de 339,5 bilhões de reais, correspondente a aproximadamente 91,9% do resultado líquido gerado pela empresa no período. Os investimentos totalizaram 226,5 bilhões de reais, representando 61% do lucro líquido total, mesmo com a alta nos preços do petróleo no mercado internacional nos anos de 2021 e 2022.
Sob a gestão de Jean Paul Prates, no período compreendido entre o primeiro trimestre de 2023 e 2024, a empresa distribuiu o equivalente a 57,3% do seu lucro líquido na forma de dividendos (85,0 bilhões de reais) e investiu o equivalente a 52,2% do resultado gerado pela companhia (77,4 bilhões de reais).
Sob a gestão de Magda Chambriard, a estatal elevou consideravelmente os investimentos, notadamente em 2024, e expandiu a distribuição de dividendos em comparação com seu antecessor. Entre o segundo trimestre de 2024 e o primeiro trimestre de 2025, a Petrobras investiu 99,5 bilhões de reais, o que representou 206,8% (duas vezes) de seu lucro líquido, e distribuiu 74,1 bilhões de reais em dividendos aos acionistas, valor superior em 154,0% ao resultado líquido apurado no período (48,1 bilhão de reais), um recorde.
a trajetória recente da produção e da distribuição da riqueza proveniente da Petrobras evidencia o conflito entre os objetivos de curto prazo dos acionistas, que buscam lucros elevados, e os interesses e as necessidades de longo prazo do setor energético nacional, focados na garantia da segurança energética e na promoção da descarbonização e da transição da nossa matriz energética. Para isso, é necessário não apenas aumentar os investimentos exploratórios, mas também elevá-los no segmento do refino, petroquímico e gás, bem como nas energias de baixo carbono, que atualmente apresentam uma queda de 48,9%, além da retomada do segmento de distribuição e revenda.
O cenário internacional complexo não pode ser uma razão para tal “restrição” voltada apenas para projetos estratégicos e sobre os trabalhadores da empresa. O compromisso social da companhia não pode se limitar à geração e distribuição de valor. As remunerações dos acionistas também devem ser reduzidas e os dividendos reinvestidos em projetos estratégicos para soberania nacional e interesse público. Em razão disso, os acionistas já foram beneficiados com quase cinquenta bilhões de reais nos últimos anos.
Fonte: Carta Capital