Aumento do limite do Microempreendedor? O que muda e o que dizem economistas
28/04/2025 às 2h20

As declarações do ministro Márcio França (PSB), da Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, após um evento em São Paulo há duas semanas, reacenderam um debate que interessa diretamente a aproximadamente 11,5 milhões de brasileiros: a discussão sobre o possível aumento do limite de faturamento para que o microempreendedor individual (MEI) e pequenas empresas se enquadrem no Simples Nacional.
Lançado em 2006, o Simples Nacional é um regime tributário simplificado destinado a micro e pequenas empresas, que consolida diversos impostos em uma única cobrança. Dados do Sebrae indicam que mais de 90% dos 11,5 milhões de MEIs registrados no país estão em atividade, um aumento em relação a 77% em 2022 e 72% em 2019.
Atualmente, o limite de faturamento do Microempreendedor Individual (MEI) é de R$ 81 mil por ano (o que corresponde a um teto mensal de R$ 6.750). Para microempresas (MEs), o limite é de R$ 360 mil anuais, e para empresas de pequeno porte, de R$ 4,8 milhões. O limite anual do MEI não é reajustado desde 2018.
A proposta do ministro do Empreendedorismo, apresentada no Palácio do Planalto, é a criação de uma tabela progressiva baseada no percentual de contribuição para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Essa iniciativa se alinha às discussões no Congresso Nacional sobre a segunda etapa da reforma tributária, que aborda questões como a formação de um comitê gestor para coordenar a arrecadação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a distribuição dos valores entre estados e municípios. O IBS unificará o ICMS e o ISS.
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“O problema é que isso [reajuste do MEI] implica na Previdência. Nós temos sugerido fazer uma ‘escada’, e o que ultrapassar os R$ 81 mil, você remuneraria por outra alíquota, como acontece no Imposto de Renda [IR].”
O Microempreendedor Individual, atualmente, contribui com 5% sobre o salário mínimo, que é de R$ 1.518 a partir de 1º de janeiro, assegurando benefícios previdenciários, incluindo auxílio-doença, pensão por morte e aposentadoria.
A contribuição mensal do Microempreendedor Individual (MEI) varia entre R$ 76,90 e R$ 81,90, já inclusos os impostos específicos de acordo com o tipo de atividade. Existe também o MEI Caminhoneiro, que contribui com 12% do salário mínimo e paga entre R$ 182,16 e R$ 188,16 mensais, dependendo da mercadoria transportada e do local de destino.
O que pode mudar
Atualmente, diversas propostas estão em análise no Legislativo relacionadas ao faturamento do Microempreendedor Individual (MEI). A proposta mais recente é o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 108, de 2021, proposto pelo senador Jayme Campos (União Brasil-MT) e já aprovado pelo Senado.
O projeto estabelece que o limite anual de faturamento do Microempreendedor Individual (MEI) aumente de R$ 81 mil para R$ 130 mil. Para as microempresas (MEs), o teto subiria de R$ 360 mil para R$ 864,4 mil. O projeto também permite que o MEI contrate até dois empregados, “desde que eles recebam, cada um, exclusivamente a quantia equivalente a um salário-mínimo ou ao piso salarial da categoria profissional”, atualmente o MEI só pode ter um funcionário.
Em agosto de 2022, a proposta obteve o parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara e, está pronta para ser votada em plenário.
Existem outros projetos que preveem alterações no MEI, como o PLP 261/2023, de autoria do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), que estabelece um reajuste automático do limite de faturamento com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial do país. O texto está pendente na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
O PLP 24/2024, proposto pelo senador Alan Rick (União Brasil-AC), estabelece a correção anual pelo IPCA e define um “teto intermediário” de faturamento de R$ 120 mil por ano. A proposta será discutida na Câmara de Senadores.
Existe risco aos recursos públicos?
Apesar do interesse público, o Metrópoles revelou que o projeto é considerado preocupante pela equipe econômica do governo, que nunca o apoiou. Economistas argumentam que a medida poderia representar um risco às contas públicas em um cenário de restrição fiscal, configurando uma “pauta-bomba” no Congresso.
Antes de ser convidado por Lula e Fernando Haddad para liderar a Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, o economista Bernard Appy já se opunha ao aumento do limite do MEI. Em entrevista ao Metrôpoles, em novembro de 2022, ele declarou que a medida teria “um custo alto, em um momento de fragilidade fiscal do país”.
A transição do sistema simplificado para o regime normal de tributação não ocorre de forma adequada quando se utiliza um sistema mal projetado, como o Simples. Mesmo no modelo atual, há um incentivo para que empresas se fragmentem para se enquadrar. Esse problema já existe, mas quanto maior o limite de faturamento, maior o escopo de empresas que vão poder se beneficiar dessa distorção do sistema.
A avaliação realizada por Appy, na época, é compartilhada atualmente por Benito Salomão, professor de Economia no Instituto de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (IERI-UFU) e especialista em finanças públicas. “Sem dúvida, isso traria um ônus muito pesado para as contas públicas. Quando se cria um programa como o MEI ou o próprio Simples Nacional, como um todo, está se criando na prática um regime de tributação diferenciada para determinados segmentos”, afirmou ao Metrôpoles.
Os setores que recebem esse regime tributário possuem uma alíquota inferior em relação aos demais setores da economia. Essa alíquota menor representa uma carência para o governo, principalmente neste momento de esforço para equilibrar o Orçamento, preservar os parâmetros do arcabouço fiscal de 2023 e estabilizar ou reduzir a trajetória de crescimento da dívida pública. Uma proposta dessa natureza gerará um impacto fiscal muito negativo sobre as contas públicas.
Diante da perda de apoio do presidente Lula, próximo das eleições, o economista avalia que o governo poderá apoiar o aumento do limite do MEI. Tanto o governo quanto a oposição, igualmente preocupados com potenciais ganhos eleitorais, se posicionam dessa forma.
Geralmente, há uma grande desigualdade legislativa entre projetos que impactam as contas públicas e aqueles que visam reduzir déficits fiscais. Matérias que geram um custo adicional para as contas públicas tendem a enfrentar menos resistência da sociedade e do Congresso, sendo aprovadas mais rapidamente. Já as matérias que buscam consolidar as contas públicas encontram maior rejeição, exigindo um esforço legislativo maior para serem aprovadas.
O economista considera que a aprovação do projeto seria muito prejudicial para a estabilidade macroeconômica do país. Espera que esse tipo de proposta não seja encaminhada neste momento. O país vem tentando equilibrar as contas públicas, além de diminuir a volatilidade na taxa de câmbio e fazer a convergência da inflação para a meta. Nesse ambiente macroeconômico muito incerto que permeia a vida nacional, matérias como o aumento do limite de faturamento MEI contribuem pouco para o Brasil.
Valores do Microempreendedor Nacional estão desatualizados.
A economista Carla Beni, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) e conselheira do Conselho Regional de Economia do Estado de São Paulo (Corecon-SP), também ouvida pela reportagem do Metrópoles, defende a discussão sobre o aumento do limite de faturamento do Microempreendedor Individual (MEI). Segundo ela, a proposta estudada pelo governo é meritória, embora precise de alguns ajustes. “A formalização é o que se pretende. Quanto maior a formalização, maior será a arrecadação. O que se busca é melhorar a formalização para que a arrecadação se eleve”, justifica.
A economista destaca a discrepância do limite para o MEI, que atingiu cerca de 35% em relação a R$ 109,3 mil anuais, desde o último reajuste em 2018. “Observamos um erro significativo ao discutir essa questão, que é o tempo necessário para ajustar as faixas. Os valores do MEI estão claramente desatualizados, pois há quase 10 anos sem correção”, acrescenta Carla.
Devíamos ter atualizações automáticas. Se o salário mínimo é corrigido minimamente pelo IPCA [Índice de Preços ao Consumidor Amplo], as faixas de todos os impostos de renda e a faixa de faturamento dessas empresas também deveriam ser corrigidas pelo IPCA. Teríamos uma pequena atualização anual. Até pode haver alguma defasagem, mas a cada 5 anos poderia ser feita uma correção.
Fonte: Metrópoles