Reflexões Gastronômicas e a Busca pelo Novo
Confesso que tenho uma peculiaridade: frequento os mesmos restaurantes e peço sempre os mesmos pratos em São Paulo. Mas, quando viajo e me afasto desse “lugar comum”, transformo-me em uma exploradora incansável, em busca das últimas novidades gastronômicas.
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Esse comportamento, que descrevo como “turista doméstico acomodado”, revela um paradoxo interessante, como apontou a antropóloga Margarita Barretto em seu “Manual de Iniciação ao Estudo do Turismo”: queremos sair da rotina e do familiar, mas, quando estamos em casa, buscamos exatamente o oposto.
A Zona de Conforto e a Dopamina
A psicologia explica que a rotina implica familiaridade e é tranquilizante para a maioria das pessoas. É um estado mental e emocional em que a segurança, a familiaridade e o conforto predominam, evitando riscos e o desconhecido. Após um dia estressante, naturalmente almejamos chegar em casa, tomar um banho e relaxar com a família.
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No entanto, quando nos acomodamos em nossa zona de conforto, tendemos a evitar desafios e oportunidades de crescimento, o que pode levar à estagnação pessoal e profissional. A busca por novidades é impulsionada pela dopamina, substância responsável por essa sensação de prazer e recompensa.
Experiências Inovadoras no Exterior
Recentemente, fiz um tour gastronômico e hoteleiro por Nova York com minha filha Cris, que trabalha no mítico hotel Waldorf Astoria, em Manhattan. Foi um banho de luxo e, principalmente, de inovação. Exploramos o “The Office of Mr. Moto”, cuja entrada já era uma experiência peculiar, parte do mistério do restaurante.
Para acessá-lo, recebemos uma carta eletrônica com um código cifrado, que precisávamos decifrar. Além disso, havia um teclado escondido em uma caixa de correio, onde inseríamos a resposta correta para liberar o acesso. A comida era deliciosa, mas o que mais me impressionou foi a ousadia dos americanos em misturar materiais, cores e texturas sem medo.
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Os hotéis Faena e The Manor exemplificam essa ousadia, transformando ambientes diurnos em noturnos em minutos.
Inspiração e Adaptação
Em outros países, como na coquetelaria autoral, com ingredientes premium e copos inusitados que transformam drinks em experiências multissensoriais, percebemos a importância de observar e aprender. A neofilia, o desejo de conhecer e experimentar o novo, é fundamental para o crescimento pessoal.
A adaptação do sanduíche de ovo mexido, que desenvolvi para a rede de hotéis por mim liderada, é um exemplo disso. É preciso ter curiosidade, humildade para aprender e coragem para adaptar o que funciona lá fora à nossa realidade brasileira, respeitando nossa cultura e o perfil dos nossos clientes.
Conclusão: A Aventura Começa em Casa
Defino uma meta para 2026: conhecer um restaurante novo a cada quinze dias e assistir a uma peça de teatro a cada dois meses. Precisamos nos aventurar pela nossa própria cidade, pelo nosso país. Deixar a nossa zona de conforto deliberadamente é uma oportunidade de crescimento pessoal.
Enquanto você estiver nela, não está aprendendo, nem crescendo. Fazer o que sempre fizemos nos trará apenas o que sempre obtivemos. O desafio está lançado: vamos ter o gostinho pelo novo não apenas quando estamos fora de nossa zona geográfica de conforto, mas dentro dela também?
Não podemos correr o risco de cair no conformismo — e, convenhamos, essa é uma perspectiva bem mais assustadora que qualquer aventura gastronômica ou cultural em nossa própria cidade. Afinal, ser turista na própria terra não é sinal de desenraizamento.
Pelo contrário: é reconhecer que o lugar onde vivemos merece a mesma curiosidade, o mesmo deslumbramento e o mesmo respeito que dedicamos aos destinos distantes. É aceitar que a aventura pode começar na esquina de casa, se tivermos olhos para enxergá-la.
