As conferências anuais da ONU sobre mudanças climáticas têm produzido diversos documentos e compromissos desde 1995. A edição deste ano, a COP30, em Belém, visa ser uma “COP de soluções”, um espaço para apresentar caminhos concretos de redução das emissões de gases de efeito estufa. A conferência também pretende apontar formas de financiar o combate ao aquecimento global. É o que diz o presidente do evento, o embaixador André Corrêa do Lago.
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“Existem muitas alternativas, algumas até menos custosas do que as atividades em curso. Essa grande quantidade de informações inéditas é pouco divulgada”, declarou o embaixador ao programa Poder em Pauta, no canal de CartaCapital no Youtube. “É possível combater a mudança do clima de maneira economicamente viável.”
O diplomata experiente em questões ambientais (foi Secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores até 15 de maio) Corrêa do Lago acredita que, com o tempo, o debate climático promovido pela ONU, maior evento diplomático anual do mundo, deixou de ser sobre meio ambiente. “Revelou-se essencialmente uma conferência sobre desenvolvimento comum”, teorizou.
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O presidente da COP é o principal negociador da agenda da conferência, responsabilidade que inclui viagens e reuniões antecipadas com autoridades públicas e representantes do setor privado. Corrêa do Lago declara não ter encontrado “negacionismo climático” entre os interlocutores, a recusa em reconhecer que o aquecimento global é real e causado pela ação humana. “O que há hoje, de certa forma, é um negacionismo sobre a efetividade do combate à mudança do clima.”
O embaixador explica esse tipo específico de visão. “Qualquer pessoa que possui um negócio ou, por exemplo, um político que tenha seus eleitores ligados a uma atividade que é prejudicial à mudança climática, essas pessoas naturalmente querem preservar o seu poder ou o seu interesse econômico”, comentou o embaixador.
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O governo de Donald Trump ilustra essa situação. Ao retornar à Casa Branca, Trump retomou a retirada dos Estados Unidos do Acordo de Paris – repetindo o movimento realizado em seu primeiro mandato, entre 2017 e 2020. Assinado em 2015, o acordo previa a transferência anual de 100 bilhões de dólares dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento, com o objetivo de proteger seus recursos naturais. Na primeira vez, os EUA precisaram aguardar quatro anos para formalizar a saída. Agora, com alterações nas normas, basta – 2026.
O secretário de Energia dos EUA, Chris Wright, admite que a mudança climática é causada pela ação humana. Contudo, conforme aponta Corrêa do Lago, ele a considera uma mera consequência do progresso e acredita que medidas de mitigação das emissões de carbono não compensam o investimento. Ex-executivo de uma petroleira, Wright prega que o planeta se ajuste às transformações, em vez de buscar sua reversão.
A posição da administração Trump pode influenciar outros atores, mas enfrenta resistência interna, aponta Corrêa do Lago. De 50 estados americanos, 37 anunciaram que permanecerão comprometidos com o Acordo de Paris, assim como a maior parte da indústria. “A realidade é que os Estados Unidos não saíram do Acordo de Paris. O governo americano, sim, anunciou que sairá. Dessa forma, não se espera atuação significativa em Belém.”
Assegurar recursos para combater o aquecimento global é um dos maiores desafios da COP30, de acordo com o diplomata. A maioria dos economistas estima que, até 2035, será preciso alocar anualmente 1,3 trilhão de dólares aos países em desenvolvimento. O Acordo de Paris previa 100 bilhões de dólares por ano, porém esse repasse não se tornou realidade.
A COP29, realizada em 2024 em Baku, capital do Azerbaijão, aumentou a meta para 300 bilhões anuais. Agora, o Brasil, como sede da COP30, deve trabalhar em parceria com o país anfitrião anterior e produzir um relatório a ser apresentado em Belém. O documento deve detalhar como a transição, até 2035, dos atuais 300 bilhões para os 1,3 trilhões estimados ocorrerá.
Conforme Corrêa do Lago, não há dinheiro público suficiente nos orçamentos nacionais para atender à transição. “É preciso ter recursos privados e tem que ter, talvez, diferentes”, afirmou. Por “recursos diferentes”, compreendem-se a taxação internacional, por exemplo, da navegação e de passagens aéreas, ideias concretamente discutidas. “Todo mundo está de olho nesse relatório”, segundo o diplomata.
Brasil e Azerbaijão receberam opiniões de economistas, do Banco Mundial e do FMI, entre outros, para a elaboração do documento. Corrêa do Lago solicitou ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a formação de um grupo de ministros das Finanças que apoie o debate. “É um grande esforço de pensar em formas mais eficientes, porque até então não se obtiveram esses recursos”, concluiu.
Fonte: Carta Capital