Crescimento do Produto Interno Bruto dos Estados Unidos desacelera, e a sombra de uma recessão ressurge
Economistas preveem que os Estados Unidos entrarão, no mínimo, em recessão técnica. Resta saber quando isso acontecerá.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, encerra a semana em que atingiu os 100 dias de governo confrontado com a China como principal foco de uma disputa tarifária que envolveu mais de 180 países, gerando uma guerra comercial global de consequências ainda incertas, e com a possibilidade de uma recessão pairando sobre a economia norte-americana.
Na última quarta-feira (30/4), os investidores dos mercados financeiros globais demonstraram ceticismo e apreensão diante dos resultados divulgados pelo Departamento do Comércio dos EUA referentes ao desempenho da economia mundial no primeiro trimestre do ano.
Segundo informações do governo dos Estados Unidos, o Produto Interno Bruto (PIB) do país registrou uma queda de 0,3% no período entre janeiro e março de 2025, em comparação com o ano anterior – a primeira recessão desde 2022.
A previsão apresentou um desempenho significativamente inferior ao esperado pelos analistas. Segundo o consenso Refinitiv, que agrega as expectativas do mercado, a estimativa era de um aumento de 0,2% nos primeiros três meses do ano.
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Em outra ocasião, o Relatório Nacional de Emprego da ADP revelou que o aumento de empregos no setor privado dos EUA teve uma desaceleração maior do que o previsto em abril, com 62 mil novas posições (em contraste com 147 mil no mês anterior). As previsões indicavam 114 mil vagas.
Trump rapidamente se manifestou nas redes sociais, negando que o resultado negativo do PIB estivesse relacionado à tarifação comercial imposta pelos EUA durante seu governo. Em mensagens divulgadas em sua própria rede, Truth Social, Trump atribuiu o retrocesso ao ex-presidente Joe Biden e solicitou “paciência” à população.
Isso demandará tempo, não tem relação com tarifas, apenas que [Biden] nos deixou com números ruins, mas, quando a alta começar, será como nenhuma outra. Sejam pacientes!
As tarifas iniciarão a valer em breve, e as empresas estão começando a se mudar para os EUA em números recordes. Nosso país vai prosperar, mas precisamos nos livrar do “excesso” de Biden, prosseguiu Trump. “Este é o mercado de ações de Biden, não de Trump. Só assumi em 20 de janeiro.”
A redução no radar.
A questão não é “se”, mas “quando”.
Atualmente, existe um forte consenso entre os economistas de que os Estados Unidos entrarão, pelo menos, em recessão técnica em algum momento, sendo a incerteza do mercado a data exata em que isso ocorrerá.
Um estudo da Apollo, gestora de ativos global, aponta para 90% de probabilidade de recessão nos EUA. Um relatório do J.P. Morgan revela que três em cada cinco especialistas do mercado financeiro preveem estagnação econômica nos Estados Unidos, acompanhada de inflação persistente acima da meta de 2% ao ano, caracterizando o cenário como “estagflação”.
O Fundo Monetário Internacional revisou as projeções para a economia dos EUA, diminuindo a estimativa de crescimento do Produto Interno Bruto em 2025 de 2,7% para 1,8%. Uma pesquisa da Bloomberg indicou que o mercado prevê uma expansão de 1,4% do PIB neste ano, em comparação com os 2,2% anteriormente projetados em janeiro. A economia dos EUA avançou 2,8% em 2024.
O Índice de Confiança do Consumidor, medido pelo The Conference Board, caiu para 86 pontos, o nível mais baixo desde maio de 2020. A Universidade de Michigan, por sua vez, apontou uma queda de 29% na confiança do consumidor norte-americano nos primeiros quatro meses de 2025.
Uma pesquisa da consultoria Elos Ayta revelou que, dentre 21 índices globais, três dos piores resultados de 2025 são das bolsas de valores de Nova York. Dentre os principais indicadores americanos, o Nasdaq, que reúne as ações de empresas de tecnologia, liderou as perdas durante os primeiros 100 dias do governo Trump, com uma queda de 11,53%. Seguiram-no o S&P 500 (-7,8%) e o Dow Jones (-7,5%).
O índice S&P 500 registra sua pior performance nos primeiros 100 dias de um presidente dos EUA desde Gerald Ford, em 1974, após a saída de Richard Nixon.
O fator Trump é determinante. Empresários e investidores não gostam de conviver com a incerteza, e Trump é uma fonte profunda de incerteza por ter um comportamento totalmente imprevisível, explica André Galhardo, consultor econômico da plataforma de transferências internacionais, Remessa Online.
Uma recessão estaria associada ao aumento do clima de instabilidade e indefinição, principalmente envolvendo questões comerciais. É difícil projetar com maior clareza o que nos espera porque estamos vendo que o discurso do governo é de idas e vindas. As coisas estão ainda um tanto indefinidas. De qualquer maneira, a possibilidade de recessão está no radar, avalia.
Segundo Mauro Rochlin, coordenador do MBA de Gestão Estratégica e Econômica de Negócios da Fundação Getulio Vargas (FGV), a guerra comercial iniciada por Trump contra diversos países pode representar um golpe para o presidente dos EUA.
A contraposição a tarifas pode ser um fator de desestímulo ao comércio internacional, levando à diminuição das exportações dos países. Para alguns países, como os Estados Unidos, a exportação é um componente relevante do Produto Interno Bruto. A consequência dessa redução nas exportações pode ser uma consequência da diminuição do crescimento econômico.
A disputa entre o presidente Biden e o ex-secretário de Estado Mike Pompeo se intensificou, com Biden acusando Pompeo de obstruir a nomeação de um procurador-geral e de tentar min
Diante do receio de que a denominada “estagflação” se concretize, os investidores também reagiram, perplexos, nas últimas semanas aos ataques de Trump ao presidente do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA), Jerome Powell, o que intensificou a instabilidade nos mercados.
Em meados de abril, Trump voltou a criticar o presidente do banco central e exigiu a queda das taxas de juros no país. O aumento das taxas de juros é a principal ferramenta dos bancos centrais para combater a inflação.
A queda nos preços do petróleo, o aumento da acessibilidade dos alimentos e a arrecadação de tarifas pelos EUA são notórios. O Fed [Banco Central do Federal Reserve] deveria ter já reduzido as taxas de juros, como o BCE fez, e certamente deveria fazê-lo agora. A demissão de Powell não pode ocorrer com demora suficiente, declarou Trump.
Posteriormente, após o encontro com a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, para um almoço, Trump reiterou as críticas a Powell e expressou o interesse em sua demissão: “Se eu pedir, ele vai embora”, declarou.
Alguns dias depois, em razão das dificuldades no mercado e da queda das bolsas nos EUA e na Europa, Trump reconsiderou, suavizou a postura e abandonou a possibilidade de demitir Powell. “Nunca tive essa intenção. A imprensa exagera as coisas”, declarou aos repórteres.
“Não, não tenho intenção de demiti-lo. Gostaria de vê-lo ser um pouco mais ativo em relação à sua ideia de reduzir as taxas de juros”, prosseguiu o presidente dos EUA. “Acreditamos que este é o momento perfeito para reduzir a taxa, e gostaríamos de ver nosso presidente [do Fed] agir com antecedência ou pontualmente, em vez de com atraso.”
A diretoria do Federal Reserve é formada por sete membros com mandatos de 4 a 14 anos, todos indicados pela Presidência dos EUA. A nomeação para o cargo de presidente do Fed é definida pela Casa Branca e confirmada por votação no Senado norte-americano a cada 4 anos.
Em 2022, Jerome Powell foi indicado pelo então presidente dos EUA, Joe Biden, para um segundo mandato à frente do Fed, que termina em maio de 2026. A visão predominante nos EUA é que o presidente do Fed não pode ser removido do cargo sem que haja uma “justa causa”. Contudo, existe um caso pendente de decisão pela Suprema Corte do país que remete a um precedente estabelecido há 90 anos, em 1935.
Em março, o Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC) do Fed anunciou a manutenção da taxa básica de juros em uma faixa de 4,25% a 4,5% ao ano. A reunião foi a segunda seguida em que a autoridade monetária norte-americana manteve a taxa de juros inalterada.
Antes das duas últimas reuniões, o Fed conduziu um ciclo de três reduções sucessivas das taxas de juros nos EUA, iniciado em setembro do ano anterior – a primeira queda em cinco anos. Desde então, o Banco Central norte-americano sempre enfatizou a necessidade de cautela e de analisar minuciosamente os indicadores econômicos para definir suas decisões de política monetária.
O Índice de Preços ao Consumidor nos EUA (CPI), na sigla em inglês, registrou 2,4% em março, na base anual, uma redução de 0,4 ponto percentual em relação ao mês anterior (que foi de 2,8%). Na comparação mensal, a taxa caiu 0,1%, após alta de 0,2% em fevereiro. A meta de inflação nos EUA é de 2% ao ano. Apesar de não estar nesse patamar, o índice tem se mantido abaixo de 3% desde julho de 2024.
A próxima reunião do Fed ocorrerá na semana seguinte, nos dias 6 e 7 de maio.
Fonte: Metrópoles