O deputado licenciado Eduardo Bolsonaro e o comentarista Paulo Figueiredo Filho, denunciado pela Procuradoria da República por tentativa de golpe de Estado, visitaram a Casa Branca pela segunda vez neste mês. Sem informações sobre os receptores e o conteúdo das discussões, os dois divulgaram fotos e vídeos para comprovar sua presença na capital dos Estados Unidos na última quarta-feira, 14 de maio.
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Na semana passada, declararam ter dedicado o dia a reuniões com membros do Departamento de Estado dos Estados Unidos. “O que estamos buscando são subsídios para que os parlamentares brasileiros respondam ao STF”, afirmou Figueiredo em transmissão ao vivo em 8 de maio.
Na semana passada, também estiveram no Departamento de Estado os deputados federais Rodrigo Valadares (UNIÃO-SE), Caroline de Toni (PL-SC), Filipe Barros (PL-PR), Maurício Neves (PP-SP), Dr. Frederico (PRD-MG) e Paulo Bilynskyj (PL-SP) e o senador Jorge Seif (PL-RJ). A reportagem confirmou com a Câmara dos Deputados que a viagem de Felipe Barros e Maurício Neves foi paga pela casa com recursos públicos. Os relatórios de viagem ainda não foram disponibilizados.
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Deputados participaram de missões oficiais coordenadas por diversas comissões do Congresso Nacional, incluindo a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (Credn), sob a presidência de Barros. Em abril, o parlamentar havia anunciado que lideraria uma comitiva aos Estados Unidos para abordar questões tarifárias com representantes americanos. Na ocasião, encontrou-se com o ex-funcionário do departamento de Estado americano e influenciador de extrema-direita Mike Benz — conhecido por criticar as redes sociais em relação à alegação de censura — para discutir supostas interferências do governo Biden no Brasil.
Qual a relevância disso?
Barros também acompanhou Eduardo Bolsonaro e Figueiredo Filho no Congresso dos Estados Unidos, onde se reuniu com os deputados republicanos Cory Mills e Brian Mast, integrantes de comissões de relações exteriores e internacionais no parlamento americano.
Em 2024, o Mast enviou uma carta ao então Secretário de Estado dos Estados Unidos solicitando que intervisse a medida que proibiu o X (ex-Twitter) no Brasil, que ele descreveu como “autoritária”. A plataforma foi suspensa devido à não observância de ordens judiciais.
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Ele se conecta com parlamentares brasileiros para conseguir mais documentos que sustentem suas críticas. Em vídeo publicado nas redes sociais, Barros declarou que está elaborando uma carta de intenções para o compartilhamento de informações oficiais entre parlamentares brasileiros e americanos, em uma espécie de comitê de trabalho.
Além da agenda, no dia 14 de maio, outros integrantes da comissão também se encontraram com o parlamentar afastado e o influenciador digital acusado de fraude.
Comitiva de apoiadores do ex-presidente Bolsonaro.
A ofensiva contra Moraes e ao STF nos Estados Unidos também conta com a colaboração – direta e indireta – de pelo menos sete outros apoiadores de Bolsonaro que optaram por se mudar para os Estados Unidos nos últimos anos.
A ex-juíza Ludmila Lins Grilo – afastada do cargo em fevereiro de 2023 por uso indevido das redes sociais e com as redes sociais banidas em 2022 por disseminar desinformação sobre o processo eleitoral – mudou-se para os Estados Unidos há três anos. Ela afirmou ter apresentado denúncia contra o ministro Alexandre de Moraes junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
“Cada conta de mídia social que for bloqueada, cada ataque do STF, cada lawfare, cada ameaça, ainda que virtual, serão utilizados em meus processos nos EUA e também serão entregues aos profissionais da mídia e da justiça estrangeiros que acompanham meu caso”, escreveu em texto na plataforma Locals, ao revelar sua mudança para os Estados Unidos.
Outros bolsonaristas atuam na ofensiva de forma indireta, pelas redes sociais, incluindo a ex-deputada federal Cristiane Brasil, os blogueiros Allan dos Santos e Max Cardoso, do portal Terceira Livre; o jornalista conservador Luís Ernesto Lacombe, e a influenciadora Renata Barreto.
Ignorando as decisões judiciais que proibiram seus perfis no Brasil, os bolsonaristas continuam divulgando informações falsas sobre o governo atual e o Poder Judiciário brasileiro, originando-se dos Estados Unidos.
Com a participação de Allan dos Santos e Max Cardoso, Lacombe fundou uma revista digital na Flórida cuja linha editorial inclui nunca mencionar Lula como presidente nem Moraes como ministro, preferindo termos como “ditador”.
Incentivando a imigração
Além de apresentar o Brasil como ditadura, caracterizando decisões judiciais como censura e buscando punições contra o ministro Alexandre de Moraes, os bolsonaristas exilados nos Estados Unidos também promovem a imigração de outros brasileiros conservadores para o país de Donald Trump.
Figueiredo e Grilo criaram, em conjunto, um escritório especializado em consultoria imigratória denominado Immigrex Global. O profissional divulga os serviços da sua empresa no início de suas transmissões diárias no YouTube. “Informaremos qual é o visto adequado para a sua vida e encontraremos uma maneira de você migrar”, assegura.
O novo canal de Lacombe também abordou o tema. Periodicamente, a Revista TimeLine realiza lives e entrevistas com a advogada Ingrid Domingues-McConville, que lidera o escritório DMVisaLaw, em Miami.
Ela foi apresentada a Lacombe por meio do jornalista Rodrigo Constantino, que reside nos Estados Unidos há mais de dez anos, e coordenou o processo de imigração dos dois. Segundo divulgado em lives, Lacombe se mudou para a Flórida com um visto tipo EB1, concedido a indivíduos com “habilidades extraordinárias” que pretendem desenvolver carreira e investir nos Estados Unidos. Alguns meses depois, recebeu o Green Card – documento de residência permanente no país – aprovado.
Devido a esse processo, outras duas brasileiras investigadas pela disseminação de desinformação sobre o processo eleitoral migraram para os Estados Unidos. A economista Renata Barreto, que responde a ação no TSE, se mudou em 2023 e teve o Green Card aprovado em maio de 2024, sob a mediação da empresa Xplore Immigration, cujos serviços ela também ajuda a divulgar em seu Instagram.
A ex-deputada federal Cristiane Brasil, filha do político Roberto Jefferson – preso por incitação ao crime, atentado ao exercício dos Poderes, calúnia e homofobia – e também alvo de inquéritos sobre fake news, se deslocou para os Estados Unidos no início deste ano, com visto de turista, buscando a residência permanente.
Enquanto espera a aprovação do seu visto EB1, Cristiane Brasil divulga os serviços da consultoria New Path Services, em Orlando. “Você que se encontra em uma situação como essa, também conservadora e de direita, como nós somos, procure a New Path. Eles oferecem soluções para o seu problema e você ficará tranquila nos Estados Unidos”, recomendou, em vídeo publicado no dia 26 de abril.
As recomendações desconsideram ou até negam o cenário atual de hostilidade contra imigrantes nos Estados Unidos. “Dizem que não há mais jeito, que o Trump vai deportar todo mundo. Mentira! Isso é coisa de comunista para te tirar a paz, o sossego”, diz Cristiane Brasil em mais um vídeo promovendo os serviços da consultoria imigratória.
Ninguém é preso na rua sem visto e expulso do país. Isso não ocorre. Você tem a oportunidade de comparecer a uma corte e apresentar seu caso. Há o devido processo legal nos Estados Unidos.
Em 17 de março, Rodrigo Constantino participou de uma transmissão ao vivo com a advogada Ingrid Domingues-McConville, intitulada “Pauta Imigratória – Trump quer você!”. Nele, os dois defendem que as políticas anti-imigração implementadas por Donald Trump visam especificamente imigrantes ilegais e que o país almeja a admissão de profissionais compatíveis com o governo vigente.
Preparem um caso excelente apresentando seus serviços à imigração, demonstrando como você pode contribuir para o projeto de resgate da América sob o governo Trump. Recomendo a equipe da Ingrid, com 30 anos de experiência.
Desde que Donald Trump assumiu a presidência em janeiro deste ano, ocorrências de estudantes estrangeiros detidos sem julgamento têm sido notórias. Um caso marcante é o do palestino Mahmoud Khalil, preso desde 8 de março por organizar manifestações pró-Palestina na universidade.
A reportagem indagou o Itamaraty acerca da propaganda favorável à imigração divulgada por bolsonaristas expurgados nos EUA, porém não recebeu resposta até a publicação.
Escapando da Justiça
Além do alinhamento ideológico com o governo americano e a busca por qualidade de vida, os bolsonaristas utilizam seus novos locais nos Estados Unidos para escapar do cumprimento da legislação brasileira.
Morando no exterior, Paulo Figueiredo Filho não pode ser citado pessoalmente no processo de tentativa de golpe de estado e teve que ser notificado por edital. “Meu processo é desmembrado porque eles sabem que comigo no exterior não podem dar andamento ao processo”, admitiu em live publicada em 8 de maio.
Ele é o único dos 34 denunciados que ainda não apresentou sua defesa e não tem data para julgamento.
Os processos contra a juíza Ludmila Lins Grilo também apresentaram atrasos devido à impossibilidade de intimação pessoal.
O caso mais emblemático, no entanto, envolve o blogueiro Allan dos Santos, que se transferiu para os Estados Unidos em 2020, após sofrer duas buscas e apreensões e ter suas contas em redes sociais desativadas no Brasil.
Após ter deixado os Estados Unidos, Allan teve a prisão decretada pelo ministro Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das fake news em 2021, sendo acusado de lavagem de dinheiro, organização criminosa e incitação aos crimes de calúnia e difamação. Contudo, o governo dos Estados Unidos negou a extradição do blogueiro, que aguarda apreciação de pedido de asilo político junto ao departamento de imigração norte-americano.
Três anos depois, o comentarista Max Cardoso seguiu os passos de seu sócio no Terceira Livre e também se mudou para os Estados Unidos. Juntos, eles continuam alimentando páginas e canais em redes sociais com conteúdos enganosos sobre a política brasileira. Em 2023, Allan fundou uma nova empresa de mídia nos Estados Unidos, que dá continuidade ao Terceira Livre. Ele também compõe a bancada das lives da Revista TimeLine, onde comenta sobre política brasileira, frequentemente com a disseminação de desinformação. A publicação de conteúdos enganosos levou ao banimento do site e redes sociais da Revista no Brasil. Contudo, os perfis seguem ativos nos Estados Unidos, com mais de 63 mil seguidores no Instagram.
Fonte: Carta Capital
