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Lupi já era

À medida que surgem mais informações sobre o escândalo de descontos não autorizados por aposentados do INSS, a situação do ministro da Previdência, Carlos Lupi, se agrava. E quanto mais ele se pronuncia para justificar sua incompetência e omissão, mais claro se torna que é hora de Lula demiti-lo. Se não o fez até o momento foi por influência política, temendo a chantagem do PDT de deixar de ser base do governo.

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O partido fundado por Leonel Brizola absorveu as dores de Lupi, sendo que seu líder na Câmara, deputado Mário Heringer, afirmou: “Demitir Lupi é demitir o partido”. O presidente, assim, fica preso a um aliado histórico, em um momento em que a fragilidade de sua base de apoio o leva a aceitar situações delicadas, inclusive devido à perda de popularidade de seu governo.

A inércia diante do cessar fogo gerado pelos desbitos não autorizados acarreta um alto custo político para Lula. Impacta diretamente a percepção de um governo que se declara dedicado à proteção dos mais vulneráveis. Os aposentados, em sua maioria, são um grupo particularmente desprotegido, enfrentando dificuldades para sobreviver com uma aposentadoria inadequada. Constitui um desprezo retirar, ilegal e criminalmente, recursos que seriam essenciais para a aquisição de medicamentos em fase de vida avançada.

Não houve, até o momento, um sinal de indignação nas declarações e ações de Carlos Lupi. Pelo contrário, quando o escândalo ganhou visibilidade, o ministro da Previdência tratou de defender o ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto – afastado pela Justiça e depois demitido por Lula –, em vez de prestar contas das ações de sua pasta para demonstrar que não se omitiu e não prevaricou.

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Optou por transferir a responsabilidade. Inicialmente, imputou o aumento dos descontos não autorizados como uma “herança maldita” dos governos Temer e Bolsonaro. Uma afirmação imprecisa. Na verdade, os descontos em contribuições para associações e sindicatos começaram em 2019, mas atingiram uma escala gigantesca sob o governo Lula. Os dados demonstram um crescimento de 273% em comparação com o último ano de Bolsonaro.

Existe um caso notório do “milagre da multiplicação” de associados. Em 2021, a Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos contava com 3 associados. Em 2024, no terceiro governo Lula, seus membros ascenderam a 600 mil, gerando uma receita de 91 milhões de reais. Quem possui algum conhecimento sobre o universo sindical e associativo, reconhece que um aumento tão expressivo de associados é praticamente inviável.

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Existem inúmeros dados que comprovam a existência de um problema significativo no INSS, e somente o ministro Lupi não o identificava. Caso o fizesse, não adotava as medidas adequadas. Uma auditoria da Controladoria-Geral da União revelou que, no primeiro semestre de 2024, mais de 742 mil beneficiários do INSS solicitaram o cancelamento do desconto associativo. Um dado crucial é que 709 mil, representados por 95,6% do total, declararam não ter autorizado os descontos praticados pelas associações.

Se a investigação da CGU identificou tamanha irregularidade, por que o Ministério da Previdência e o INSS não realizaram uma investigação própria, considerando que Lupi sabia, desde janeiro de 2023, sobre denúncias de fraudes nas mensalidades ilegais descontadas de aposentadorias e pensões? O governo Lula foi alertado sobre o crescimento exponencial das fraudes por órgãos como o Tribunal de Contas da União, a CGU, o Ministério Público e o Conselho Nacional da Previdência Social, além de auditores do próprio INSS.

A revelação de omissão do ministro é agravante. Na reunião do Conselho Nacional da Previdência Social de 12 de junho de 2023, a então conselheira Tônia Galleti solicitou a discussão sobre os acordos de cooperação técnica das entidades com desconto de mensalidades junto ao INSS. Caso seu pedido tivesse sido atendido, o escândalo teria se tornado público antecipadamente. Em declarações posteriores, Tônia afirmou que alertou Lupi sobre a prática dos descontos não autorizados já no início de janeiro de 2023.

O ministro admitiu ter conhecimento das denúncias há mais tempo. Em entrevista à Folha de S. Paulo, reconheceu que “há muita safadeza” no INSS, afirmando: “tento resolver, mas não sou Deus”. Essa atitude se repete em outras declarações de Carlos Lupi, para quem “tudo no governo é demorado”. Se é assim, resta aos aposentados rezar a Deus, para que a divina providência dê um jeito para não serem assaltados por quadrilhas de falsários, como as investigações vêm revelando.

Enquanto Lupi permanece no cargo, questionamentos ressuscitam fatos que Lula preferia deixar no passado. O episódio se assemelha a um caso anterior, envolvendo Carlos Lupi, então ministro do Trabalho no governo Dilma, que foi destituído. A principal alegação era que o Ministério do Trabalho, sob sua gestão, teria promovido acordos com ONGs ligadas ao PDT utilizando recursos públicos sem a devida fiscalização. Surgiram também denúncias de propinas para a liberação desses repasses. Na época, Carlos Lupi afirmava: “Só saí do governo se fosse à bala”.

Lula poderá agora fazer o mesmo? Ainda não há uma resposta, mas é possível diante do potencial do escândalo. A memória coletiva do brasileiro é muito marcada por grandes crises de corrupção, que foram massivamente cobertas pela mídia, julgadas judicialmente e que contribuíram decisivamente para o desgaste do Partido dos Trabalhadores e para o impeachment de Dilma Rousseff.

A reativação do vínculo com o Petrolão e o Mensalão ocorre sempre que surge um novo escândalo, ainda que de menor porte ou com características distintas, gerando a alegação de “novas corrupções no governo do PT”.

Hubert Alqueres é presidente da Academia Paulista de Educação.

Fonte: Metrópoles

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