Mourão e Aldo declaram não apoiar o golpe, mencionam risco de prisão e cometem erro
O Supremo Tribunal Federal encerrou na tarde de sexta-feira a primeira semana de depoimentos de testemunhas no processo relacionado à trama golpista.

A testemunha arrolada nesta sexta-feira (23) no processo que investiga a tentativa de golpe de Estado foi o ex-ministro dos governos Lula e Dilma, Aldo Rebelo, que enfrentava ameaça de prisão por desacato e estava envolvido em uma confusão da Procuradoria-Geral da República (PGR).
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Rebelo foi ouvido como testemunha de defesa do comandante da Marinha, Almir Garnier. A tensão começou ainda no início do depoimento.
O advogado de Garnier, Demésthenes Torres, indagou Rebelo se o ex-comandante havia mobilizado unidades da Marinha para disposição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em uma tentativa de golpe de Estado, conforme alegado por outros depoentes.
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Rebelo iniciou sua resposta afirmando que a língua portuguesa não deve ser sempre interpretada de forma literal. O ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, interrompeu o depoimento, declarando que Rebelo não participou da reunião em que Garnier teria proferido a fala, e, não poderia avaliar o “conteúdo da língua portuguesa” do ex-comandante.
“Atenha-se aos fatos”, declarou Moraes. Rebelo retrucou: “Minha apreciação da língua portuguesa é minha. Não vou admitir censura”. Nesse momento, o ministro solicitou que Rebelo se comportasse e ameaçou prendê-lo por desrespeito.
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A tensão persistiu até o término da sessão. Rebelo manteve uma postura confronta durante todo o depoimento, questionando as decisões do ministro.
O procurador-geral, Paulo Gonet, indagou Rebelo se a Marinha possuía condições de promover um golpe de Estado por conta própria.
A questão, contudo, já havia sido respondida pela testemunha a favor de Garnier e foi rejeitada por Moraes por ser considerada “sem lastro na realidade”.
O ministro relator, contudo, não interrompeu a pergunta de Gonet e o advogado o questionou: “Ele está pedindo opinião, Vossa Excelência. Se eu não posso pedir opinião, ele também não poderia”.
Moraes determinou, então, que Gonet reformulasse a pergunta de maneira mais objetiva. Durante a resposta, Paulo Gonet, acreditando ter mudado o microfone, declarou: “cometi um erro agora”.
O depoimento de Aldo Rebelo teve aproximadamente 25 minutos de duração e, devido ao clima de tensão, foram feitos poucos esclarecimentos sobre os detalhes da acusação.
Aldo destacou, a partir de suas investigações, que a Marinha não possuía a capacidade de promover um golpe de Estado sem o apoio do Exército e da Aeronáutica.
O relato segue as investigações da Polícia Federal, que indicaram que a ausência de anuência dos comandantes do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, e da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, foi determinante para que o golpe não fosse concretizado.
Aldo Rebelo defendeu que a Marinha possui limitada abrangência do território nacional, atuando primordialmente na zona costeira devido ao seu foco em fuzileiros navais, embarcações e submarinos.
Uma operação de controle de território exigiria que ela tivesse uma composição que ela não tem, a não ser que fosse na época do Tratado de Tordesilhas, quando o Brasil era uma faixa de terra muito próxima do litoral. A atuação da Marinha é muito limitada para qualquer projeto de operação que está em debate nos dias de hoje, disse o ministro em tom de ironia.
Mãe
O senador e ex-vice-presidente Hamilton Mourão declarou não ter conhecimento de qualquer negociação relacionada a um projeto para obstruir a posse de Lula e garantir a permanência de Bolsonaro no poder.
De acordo com Mourão, todas as reuniões das quais participou após as eleições versavam unicamente sobre a transição de governos.
O senador afirmou também que buscou contato com o ex-presidente no dia dos resultados da eleição, porém, não houve muita conversa devido ao estado de abatimento de Bolsonaro.
No dia seguinte, se reuniram no Palácio do Planalto para debater o começo da transição e Mourão desmentiu qualquer ordem de Bolsonaro para dificultar o processo.
Bolsonaro afirmou que estava pronto para transferir o poder para o novo presidente.
Mourão também declarou que mensagens provenientes do celular do tenente-coronel Mauro Cid, que mencionavam sua participação em reuniões para discutir uma trama golpista, eram “falsas” e uma “invencionice da internet”.
O procurador-geral, Paulo Gonet, questionou Mourão sobre sua participação em um encontro onde militares teriam rasgado um decreto golpista assinado por Bolsonaro. O caso foi confirmado por Mauro Cid em depoimento.
A declaração negativa do senador levou a Gonet a perguntar se ele estava afirmando que Mauro Cid havia mentido em uma ocasião. O posicionamento do procurador nas sessões de quinta e sexta-feira se diferenciou do da primeira audiência, na qual demonstrou pouca assertividade e evitou abordar contradições.
Um ponto relevante do depoimento de Mourão foi sua percepção acerca dos atos de 8 de janeiro. O ex-vice-presidente declarou que a intervenção militar solicitada por manifestantes era “impossível” e classificou os atos como “bagunça”, aduzindo que os ataques ocorreram devido à “negligência” do governo Lula.
A acusação de golpe é negada.
Na mesma tarde, o atual comandante da Marinha, Marcos Olsen, afirmou não ter conhecimento de qualquer plano de mobilizar tanques para impedir a posse de Lula e que também não recebeu ordem nesse sentido.
Todas as testemunhas desta tarde prestaram depoimentos em consonância com esta versão. Diferentemente das testemunhas da acusação, ouvidas na segunda e na quarta-feira, todos os depoentes desta sexta-feira negaram ter conhecimento de qualquer plano ou minuta de golpe.
Fonte: CNN Brasil