O Brasil interrompeu a colaboração jurídica com o Peru em investigações relacionadas à construtora Odebrecht
A decisão foi tomada após autoridades peruanas utilizarem evidências da Operação Lava Jato desconsideradas pelo ministro Dias Toffoli.

A Secretaria Nacional de Justiça, ligada ao Ministério da Justiça, interrompeu a colaboração jurídica com o Peru nos casos relacionados à Odebrecht (atual Novonor) na Operação Lava Jato. Segundo informações do jornal O Globo, que obteve acesso ao documento confidencial, a decisão foi tomada na terça-feira (7.mai.2025) após as autoridades peruanas apresentarem evidências consideradas inválidas pelo ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal).
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O documento oficial foi assinado pelo secretário nacional de Justiça, Jean Uema. A suspensão ocorreu preventivamente após a Novonor alegar que o Peru não cumpria as restrições ao uso de provas previstas nos termos de compromisso dos acordos de cooperação.
O secretário nacional de Justiça suspendeu os acordos após aguardar esclarecimentos do governo peruano por quase um ano, sem obter resposta.
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A ação segue uma compreensão análoga da PGR (Procuradoria Geral da República), que, em abril de 2024, interrompeu os acordos de cooperação com o país vizinho pelas mesmas razões.
A atuação do Ministério da Justiça e da PGR se baseou na anulação das provas derivadas do acordo de colaboração premiada da empresa construtora, decretada por Toffoli em setembro de 2023. Nessa ocasião, o ministro classificou a operação como “uma armação resultante de um projeto de poder por parte de certos agentes públicos em seu intento de conquistar o Estado por meios aparentemente legais”.
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A Procuradoria-Geral da República informou que a decisão de suspensão foi tomada “após constatar razões fundadas para o uso indevido de elementos de prova fornecidos por colaboradores do Ministério Público brasileiro em sua contraposição na jurisdição peruana, violando cláusula do tratado de cooperação”.
A acusação peruana declarou ter enviado uma resposta em relação a documentos considerados irregulares no Brasil, contudo, ainda não recebeu retorno das autoridades brasileiras. O material enviado do Peru ainda não foi avaliado pelo Brasil.
A Lava Jato e o Peru
A suspensão impacta o Peru, nação com o maior volume de políticos investigados, indiciados ou condenados por crimes relacionados à Lava Jato. Dentre os envolvidos estão os ex-presidentes Alejandro Toledo (2001-2006), Ollanta Humala (2011-2016) e Pedro Pablo Kuczynski (2016-2018), que são acusados de crimes relacionados a caixa dois em campanhas eleitorais. Eles contestam veementemente as acusações.
Em 2019, o ex-presidente Alan García (1985-1990 e 2006-2011) cometeu suicídio para evitar uma prisão preventiva em processo da Operação Lava Jato.
Nadine Heredia, esposa do ex-presidente Humala, obteve asilo político no Brasil após ser condenada a 15 anos de prisão em abril de 2025. O Conare determinará se ela recebe o status de refugiada.
Leonardo Massud e Marco Aurélio de Carvalho, advogados que representam Heredia em sua solicitação de refúgio no Brasil, celebraram as decisões do Ministério da Justiça e da PGR. Em nota enviada a este Poder360, afirmaram que a suspensão “parece pôr fim a uma série de irregularidades que o Ministério Público e a Justiça peruana cometeram ao longo de toda a cooperação jurídica havida com o Brasil na Operação Lava Jato”.
A Novonor entrou com uma arbitragem contra o Estado peruano em Londres. A empresa busca uma compensação de cerca de US$ 1 bilhão referente aos investimentos feitos na construção do gasoduto. O projeto alcançou 30% da sua execução pela empresa brasileira. Os bens, notadamente os dutos, foram tomados pelo governo peruano em 2017.
Ao ser questionado sobre o processo arbitral em Londres, a entidade declarou que “não pode fazer nenhuma declaração a respeito devido ao fato de que a arbitragem internacional é confidencial”.
Leia a íntegra da nota dos advogados Leonardo Massud e Marco Aurélio de Carvalho:
A decisão da Secretaria Nacional de Justiça parece encerrar uma série de irregularidades que o Ministério Público e a Justiça peruana praticaram ao longo da cooperação jurídica estabelecida com o Brasil no âmbito da Operação Lava Jato. Diversos episódios ocorreram em que os órgãos peruanos descumpriram os compromissos assumidos com os delatores, e isso não se limitou a isso.
As decisões de anulação dos exames obtidos por meio dos sistemas da empresa foram de forma alguma consideradas.
É ainda mais grave o fato de que o Poder Judiciário peruano tem reiteradamente promovido audiências com indivíduos que se encontram no Brasil, por videoconferência, sem a participação e intervenção da Justiça brasileira. Audiências realizadas em consulados peruanos, configurando uma flagrante violação da soberania nacional. Além do cancelamento da cooperação internacional, é fundamental alertar a representação diplomática peruana que atos assim usurpam poderes da nossa República e não serão tolerados.
Nadine Heredia e Ollanta Humala são inocentes e foram vítimas de uma condenação injusta, sem qualquer evidência.
É importante ressaltar que o casal não foi acusado por corrupção, mas por um suposto ilícito eleitoral baseado apenas na palavra de um denunciante, e que já suscita dúvidas no próprio Peru. Continuamos convictos de que, ao final deste processo, a verdade será restabelecida.
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Fonte: Poder 360