Região serrana enfrenta risco de transformação em áreas desérticas no norte e oeste do estado do RJ
O desmatamento destruiu os importantes sistemas de regulação hídrica representados pelas florestas, gerando erosão, inundações e secas intensas.

A inclusão, em termos legais, dos municípios das regiões Norte e Noroeste Fluminense no mapa do semiárido brasileiro, recentemente aprovada pelo Congresso Nacional, gera diversas reflexões. Positivamente, os agropecuaristas terão acesso a benefícios excepcionais que antes eram inacessíveis. E negativamente, podemos analisar essa questão em conjunto.
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Uma primeira questão seria se os benefícios decorrentes da nova lei tendem a melhorar ou agravar o cenário climático na região. Sabemos que a questão climática é global, mas que seus impactos nos níveis local e regional são muito diferenciados. Sabemos também que nessas duas regiões, originalmente situadas nos biomas Mata Atlântica e Costeiro, as secas mais severas — que assolam regiões de climas os mais diversos, assim como as grandes inundações — foram como que convidadas pelo tipo de uso da terra no território em questão. É preciso marcar: foram o desmatamento e a drenagem excessiva de lagoas que tornaram a região semiárida! Diante disso, qual é a resposta da sociedade representada pelo poder público? Ampliar o apoio à atividade agropecuária — uma solução controversa, que não mexe na questão de fundo, que é ambiental.
A questão da seca no norte e oeste do estado do Rio de Janeiro reside no solo e não na atmosfera. Seria impressionante observar um filme com relatos de viajantes europeus que passaram pela região, como Maximiliano de Wied-Neuwied (1782-1867), Auguste Saint-Hilaire (1779-1853), Hermann Bursmeister (1807-1892) e Jacob Tschudi (1818-1889), conforme mencionado por um dos autores deste artigo.
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Seus registros escritos evidenciam o entusiasmo com as florestas locais e o alerta quanto aos impactos de sua destruição por incêndio e pelo uso de ferramentas de corte. A região não era, originalmente, árida como no semiárido. O desmatamento contínuo eliminou o importante controlador de águas que representavam as florestas, gerando erosão, assoreamento, inundações e secas intensas. Adicionalmente, a drenagem excessiva removeu importantes reservas de água doce, desencadeando um processo de ressecamento contínuo em certas áreas. Isso ocorreu principalmente para atender às necessidades de usinas e disponibilizar terras para a agricultura e a pecuária.
Essa reflexão deve estimular a sociedade regional a não se opor aos agropecuaristas fluminenses — que, em última análise, têm o direito de participar do jogo político e defender seus interesses –, mas a se organizar em torno de pautas que atendam à exigência civilizacional do nosso tempo. Se aplicado de forma isolada, sem estar associado a outras ações, o projeto de lei aprovado pode aprofundar ainda mais a semiaridez. Como assegurar que isso não ocorra? Quais são as perspectivas de uma política governamental que destine recursos para recriar áreas úmidas na Baixada Campista e reflorestar pontos críticos na região serrana? Quais são os compromissos dos representantes políticos da região com uma agenda que corrija — ou pelo menos comece a corrigir — a desigualdade na imposição dos custos ambientais aos diferentes segmentos da população?
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A situação política no Brasil e no mundo tem sido instável e volátil. Diante do avanço de grupos contrários às questões socioambientais, seus líderes realizam manobras que dificultam a permanência de apoiadores com senso crítico. Essa realidade possibilita a formação de novos acordos, parcerias e pautas. É necessário desenvolver uma habilidade política coletiva para construí-las.
Este é um artigo de opinião e não representa necessariamente a linha editorial do Brasil do Fato.
Fonte por: Brasil de Fato