SP transferiu R$ 40 bi da Educação para pagar aposentadorias em 5 anos
17/11/2023 às 16h36
O governo de São Paulo deixou de aplicar quase R$ 40 bilhões na Educação paulista nos últimos cinco anos para bancar os pagamentos de aposentadorias.
O valor calculado corresponde ao montante que foi retirado da verba destinada à manutenção e ao desenvolvimento do ensino público para cobrir o déficit da previdência de servidores da educação, entre os anos de 2018 e 2022. A soma final foi corrigida pela inflação no período.
Apenas neste ano, de janeiro a agosto, mais de R$ 9 bilhões destinados ao ensino foram usados para pagar aposentadorias.
A gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos) está analisando o orçamento da educação e propôs uma emenda à Constituição (PEC) para possibilitar uma maior flexibilização dos investimentos no ensino de São Paulo.
A Constituição Estadual determina que o governo destine pelo menos 30% da receita líquida com impostos para o ensino público. O percentual é maior do que o exigido pela Constituição Federal, que estabelece piso de 25% da arrecadação para a Educação.
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A ideia de Tarcísio é criar um dispositivo legal que permita transferir os 5% “extras” da Educação para a área da Saúde, quando o governo julgar necessário.
Muitos especialistas em educação têm criticado a medida, argumentando que não há dinheiro extra na área e apontando o histórico de falta de compromisso com o cumprimento do piso salarial no estado.
Problemas com o cumprimento de normas ou regras ao longo do tempo.
Em 2000, uma investigação na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) descobriu que o valor mínimo de 30% exigido para a educação não estava sendo obedecido.
O relatório final da comissão citava que as despesas com o ensino “apresentavam-se indevidamente majoradas de despesas previdenciárias”.
A prática contraria a legislação federal sobre o tema. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) indica o uso da verba para despesas como o salário de professores, a compra de material didático e a manutenção de equipamentos.
A lei não fala sobre o uso do dinheiro da educação para aposentadoria.
Desde 2018, as administrações que governaram São Paulo usam uma lei estadual, aprovada pelo ex-governador Márcio França (PSB), para explicar a utilização dos recursos.
A lei permite ao governo utilizar uma parte a mais do valor estabelecido pela Constituição Federal, que é de 25%, para cobrir as despesas necessárias para manter equilibrado o sistema de previdência.
Em 2020, a Procuradoria-Geral da República entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a constitucionalidade da lei paulista. A ministra Cármen Lúcia, relatora da ação, já declarou seu voto contrário à manobra, mas o julgamento do caso ainda não foi finalizado.
O STF já havia declarado inconstitucional outra lei paulista, de 2007, que também permitia utilizar a verba da Educação para o pagamento do déficit previdenciário.
Fundeb é a sigla para Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica. Este fundo promove a distribuição de recursos para a educação em todo o país e tem como objetivo aprimorar a qualidade do ensino oferecido nas escolas brasileiras.
Nos últimos anos, análises do Ministério Público de Contas mostraram que o governo estadual chegou a usar até mesmo o dinheiro do Fundeb, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica, para cobrir o déficit na previdência.
Em 2018, foi descoberto que mais de R$ 3 bilhões do Fundeb foram desviados. O Tribunal de Contas do Estado (TCE) questionou o uso inadequado desses recursos e acabou fazendo um acordo com a gestão João Doria (sem partido) para diminuir gradualmente essa prática até 2024.
Segundo a administração de Tarcísio, ele não usa o dinheiro do Fundeb para pagar aposentados e pensionistas da Educação.
A lei que aprovou o novo Fundeb, em 2020, deixou claro que os recursos não podem ser usados para pagar aposentadorias e pensões.
Impacto nas escolas
Ao utilizar recursos de uma área para outra, falta dinheiro para resolver problemas antigos da educação em São Paulo, como salas de aula superlotadas e falta de infraestrutura nas escolas.
Para o professor José Marcelino de Rezende Pinto, da Universidade de São Paulo e vice-presidente da Fineduca, a não observância do mínimo de 30% de investimento é uma das razões para a deterioração da educação em nosso estado recentemente.
Ele menciona que a falta de laboratórios nas escolas, o baixo salário dos professores e a alta quantidade de educadores temporários são alguns dos principais problemas.
“É uma rede em que mais de 40% dos professores são temporários. Como é que se constrói um projeto educacional como professores que a cada ano são demitidos e podem ser contratados para outras escolas?”, diz o especialista.
José Marcelino diz que a proposta enviada por Tarcísio para a Alesp prejudica os planos de melhorias na área.
“Se hoje o piso de 30% já não é cumprido, a gente vai chegar nos 25% como teto”, diz ele.