“The Local” busca transformar o jornalismo televisivo em 4 estados

A publicação da newsletter Dinner Party na plataforma visa atrair um público maior de leitores. Leia no Poder360.

11/05/2025 5h55

10 min de leitura

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(Imagem de reprodução da internet).

Corey Hutchins

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Em todo o país, o mesmo tipo de corte orçamentário que prejudicou os jornais está agora afetando as emissoras de TV locais.

Uma publicação especializada em radiodifusão alertou recentemente: “A tendência de demissões no noticiário televisivo está apenas começando”.

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A empresa busca renovar o noticiário local em um cenário de streaming e descontinuação dos pacotes de TV convencionais. Os fundadores estão em negociações com investidores para lançar o projeto em quatro estados, com potencial de expansão para todo o país.

Não se trata da nova iniciativa de Chuck Todd, ex-apresentador do Meet the Press e jornalista da NBC, que teria como objetivo um investimento de US$ 2 bilhões (R$ 11,22 bilhões) para ingressar no noticiário local. Trata-se, sim, de um projeto chamado The Local, fundado por Todd Landfried e Hitesh Patel, da N2 Media.

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Landfried, autor do conceito de Local, possui experiência nas áreas de tecnologia, política e mídia, residindo na Califórnia; Patel foi um dos primeiros executivos da Current TV e reside no Reino Unido.

A empresa pretende, futuramente, estabelecer uma rede de escritórios em todos os estados, com um modelo de negócios inédito. O Local busca se distanciar do formato e das práticas convencionais da rádio local. Os fundadores acreditam possuir uma solução para o financiamento que não depende unicamente de publicidade, mas de acordos de conteúdo com plataformas de streaming.

Não se trata de se tornar outra rede de TV ou canal de notícias 24 horas.

“Não estamos tentando adaptar o modelo antigo a uma nova fonte de financiamento”, disse Landfried. “Estamos construindo tudo do zero”, afirmou.

O projeto ilustra como certos jornalistas estão reavaliando a televisão local em um período de mudança. Embora a TV local permaneça um meio confiável, há indicadores de declínio do público e as emissoras sofrem com dificuldades financeiras. Durante o governo Trump, também não seria surpreendente antecipar ondas de desregulamentação que podem resultar na consolidação de empresas e, ainda, em mais demissões. Paralelamente, os consumidores americanos estão cada vez mais atentos aos serviços de streaming, incluindo conteúdos ao vivo e esportivos.

O noticiário local encontra-se em grave crise neste momento e requer uma completa reformulação, afirmou Landfried em entrevista. “Assim, o que temos feito nos últimos anos é desenvolver um modelo que realize exatamente isso. Reinventamos a maneira como o noticiário local será produzido, financiado e distribuído”, declarou.

Os fundadores concebem um telejornal noturno em cada estado, com duração de até uma hora, dedicado a jornalismo de interesse público, apresentando diversas reportagens aprofundadas. Preveem o lançamento inicial no Colorado, seguido por expansão para Califórnia, Geórgia e Kansas em até um ano.

Sem pausas comerciais ou limitações de horário no horário, os segmentos do Local podem ter diversas durações, proporcionando mais detalhes e contexto. Em seguida, seriam abordadas matérias regionais, seguidas por segmentos locais e hiperlocais adaptados ao CEP do público.

A singularidade do produto reside no fato de o público encontrá-lo em plataformas como Netflix, Amazon Prime, Roku ou Max. Isso significa que ele está onde os telespectadores estão há anos e onde os compradores de programação investem grandes quantias em conteúdo.

Precisamos de mais alternativas.

Nas campanhas direcionadas a investidores, a N2 Media – holding sediada em Delaware – ressalta o declínio dos jornais locais. A redução do setor gerou áreas com falta de notícias e veículos desativados em várias comunidades.

As plataformas de streaming estão investindo bilhões em conteúdo, porém não possuem uma fonte escalável de jornalismo local original e de qualidade, segundo uma apresentação da N2 Media.

Para solucionar tal questão, o Local propõe uma medida inédita, até então não tentada ou realizada: a exibição de notícias locais nas telas de serviços de streaming pagos, com financiamento da própria plataforma. Caso ocorra, os espectadores teriam acesso às últimas notícias do governo estadual ou da câmara municipal ao lado de episódios de “Black Mirror” ou “Ruptura”.

A empresa considera que o investimento de um único contrato de produção com uma plataforma já seria suficiente para sustentar uma rede de 50 estados com notícias diárias, e ainda custaria menos do que a produção de uma minissérie de 10 episódios sobre crimes ou história. Dada a natureza local do conteúdo, a plataforma poderia comercializar publicidade local, gerando uma receita que, atualmente, provavelmente é desperdiçada.

As plataformas de streaming estão investindo somas enormes em conteúdo, disse Landfried. Segundo ele, mesmo com estimativas variáveis, elas devem gastar aproximadamente US$ 250 bilhões [R$ 1,4 trilhão] neste ano na aquisição de conteúdo, sem que isso ocorra por meio de notícias.

Tal pode ser o caso.

As plataformas de streaming – também conhecidas como OTT ou SVOD – estão aumentando seus investimentos em programação, mas são tradicionalmente utilizadas para assistir conteúdo sob demanda, e não ao vivo. Jovens, que deixaram a TV a cabo, costumam se informar online e não possuem vínculo com notícias locais transmitidas por televisão.

“Todos estão produzindo conteúdo para OTT, mas a questão é: quanto disso as pessoas realmente querem?”, disse Al Tompkins, veterano da indústria e professor do Poynter Institute. “Esse conteúdo tende a ser atemporal, enquanto o noticiário local trata do que está acontecendo agora.”

Existe, de fato, grande quantidade de conteúdo jornalístico – incluindo material local – disponível no streaming, porém isso se deve, em grande parte, aos acordos estabelecidos por emissoras tradicionais para estarem nessas plataformas. Quem deseja saber o que ocorre no próprio estado ou cidade consegue encontrar, mas precisa procurar.

“O mercado está saturado de noticiários disponíveis de todos os lugares”, declarou Michael Depp, editor do site TVNewsCheck. “Se você realmente se importa com determinada região – ou várias, se for um viciado em notícias”, pode montar seu próprio cardápio, gratuitamente, com o que já existe disponível”.

Tim Hanlon, que reside em Chicago, demonstrou ceticismo ao ser contatado por um representante da N2 Media após ter publicado uma coluna em dezembro na TVREV com o título “O caminho para a reinvenção: por que o noticiário local precisa de uma ruptura para avançar”. O executivo, especialista na convergência entre TV e vídeo digital, já observou o fracasso de diversos projetos com o objetivo de revitalizar o noticiário local.

Atualmente, ele é conselheiro do Local.

“Acredito que necessitamos de mais perspectivas, mais análises – mais tentativas, – sobre como repensar, reinventar e renovar a cobertura jornalística local”, declarou. “Para mim, esse projeto parecia uma convergência de conceitos positivos.”

Hanlon percebe que a ideia é complexa, sobretudo considerando os atuais desafios políticos e culturais que o jornalismo enfrenta.

Ele afirmou que já seria difícil em seis meses ou dez anos, mas agora é ainda mais complicado devido ao que chamou de “besteiras regulatórias e políticas performáticas” que desestimulam o jornalismo em vez de incentivá-lo.

Contudo, o que se destaca é considerar o que pode ser feito pelo jornalismo local, em vez de apenas “gerenciar o declínio”, conforme sua descrição da estratégia atual da TV local.

Ademais, segundo ele, nada mais seria necessário do que “sim” para que o Local se concretizasse.

O que a história precisar.

Isto, embora ambicioso, ainda é aspiracional.

Um grupo de dez conselheiros voluntários procura investidores para financiar episódios-piloto em quatro estados iniciais, selecionados com base em critérios geográficos e demográficos.

Patel, cofundador e diretor financeiro da N2 Media, afirmou: “Temos capacidade de escalar para os 50 Estados rapidamente”.

“Não precisamos de celebridades como âncoras, nem de reportagens tradicionais”, acrescentou. “Quero algo com custo viável.”

Construir uma equipe de jornalismo de alta qualidade apresenta desafios, ainda que existam muitos profissionais locais em busca de trabalho atualmente.

Carol Wood, responsável pela operação de notícias da N2 Media, está montando uma Redação com aproximadamente 15 pessoas para o projeto-piloto no Colorado. Ela está selecionando um editor-chefe e elaborou uma planilha com nomes de jornalistas locais que poderá contratar.

“Você não precisa ter experiência em TV”, disse Wood, que reside no Colorado e trabalha com sustentabilidade no jornalismo local. “A maioria das pessoas na lista não possui experiência com TV. Vejo uma oportunidade de formar um time dos sonhos, tanto local quanto nacional.”

A oferta de notícias locais em uma plataforma de streaming aumentaria a qualidade do conteúdo, segundo Wood. As reportagens mais extensas se distancariam do formato convencional, em que matérias rápidas são “espremidas” entre informações sobre clima, esportes e publicidade.

A proposta é que, se uma narrativa justifica 4 ou 6 minutos para profundidade e contexto em um ambiente visual – no tempo que o repórter ou o editor considerarem necessário –, poderemos realizar isso. Não haverá exigência de que seja um vídeo de 15 ou 30 segundos que precise caber em um espaço pré-definido. É o tempo que a história precisar.

A iniciativa não contemplará âncoras, programas de televisão, transmissões de satélite ou jornalismo de opinião – apenas reportagens factuais sobre assuntos locais, sem alcance nacional ou internacional. Para fornecer conteúdo hiperlocal, o projeto pretende contratar redatores comunitários em todo o estado, incluindo áreas rurais, e remunerar cada reportagem com até US$ 1.500 (R$ 8.415).

Dessa forma, o argumento é que uma plataforma de streaming com recursos poderia beneficiar as editoras locais, que têm sofrido prejuízos causados pelas grandes empresas de tecnologia.

Bronagh Hanley, ex-diretora de comunicações da Netflix na década de 2000, uniu-se à N2 Media e ao Local com a convicção de que as plataformas de streaming e redes sociais devem oferecer notícias, visto que são elas que impulsionam a forma como as pessoas se informam atualmente.

Apesar de os envolvidos evitarem divulgar os financiadores e plataformas de streaming em negociação, um dos desafios é a questão: “Qual é o nome famoso de vocês?”

“Essa pergunta perde completamente o foco”, disse Hanley. “A questão é que existem desertos de notícia, agora mesmo, que precisam ser enfrentados neste país, e estamos sob ameaça como democracia – ainda é possível ganhar dinheiro fazendo isso.”

Matthew Keys, responsável pelo Desk na região norte da Califórnia, que acompanha de perto as indústrias de radiodifusão e streaming, afirmou que a estratégia da N2 Media aparentava ser uma ideia inovadora, caso fosse implementada com sucesso.

Diante do acompanhamento das recentes demissões em emissoras de TV e dos esforços de algumas redações para se consolidar, extinguir programas ou até mesmo encerrar, ele está muito consciente do cenário atual da indústria.

Ele afirmou que, caso alguém busque reinventá-la, é preciso lançar no mercado um produto que impressione as pessoas, o que seria algo extremamente difícil de realizar. Adicionalmente, expressou otimismo quanto à capacidade deles de sucesso, considerando que, em caso de êxito, eles estabeleceriam um modelo a ser seguido, o que fortaleceria a indústria.

Corey Hutchins é o gerente do Instituto de Jornalismo da Universidade do Colorado.

Texto traduzido por Victor Boscato. Leia o original em inglês.

O Poder360 estabeleceu parceria com duas divisões da Fundação Nieman, de Harvard: o Nieman Journalism Lab e o Nieman Reports. O acordo prevê a tradução para o português dos textos produzidos por essas divisões e sua publicação na plataforma do Poder360. Para acessar todas as traduções já publicadas, clique aqui.

Fonte: Poder 360

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